Turma afasta exigência de idoneidade de crédito a vigilantes terceirizados do BACEN .
A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho deu provimento a recurso do Ministério Público do Trabalho da 6ª Região (PE) e considerou ilegal cláusula de edital de licitação do Banco Central do Brasil que impedia a contratação, por empresa terceirizada, de vigilante com restrição de crédito, constatada em consulta a serviços de proteção ao crédito. A Turma avaliou que a situação financeira do empregado não tem vinculação com o serviço a ser prestado, tampouco atesta sua idoneidade. Ao contrário, trata-se de escolha de fator arbitrário na seleção dos vigilantes a serem contratados.
Em maio de 2005, a Gerência Administrativa Regional em Recife (Adrec) do BACEN celebrou contrato de prestação de serviços de vigilância, proteção e segurança ostensiva armada com a Nordeste Segurança de Valores Ltda. No edital do pregão, o item 7.3 estabelecia que a empresa a ser contratada deveria apresentar declaração, assinada por seu representante legal, responsabilizando-se pela idoneidade e pelo bom comportamento dos empregados alocados na execução dos serviços.
Um dos desdobramentos desse item exigia que os vigilantes contratados não tivessem restrições creditícias, mediante consulta aos serviços de proteção ao crédito. Apesar da previsão contratual, o BACEN não vinha exigindo essas informações, mas, após sofrer auditoria interna, a Adrec passou a exigir da Nordeste a apresentação de certidões comprobatórias de que os vigilantes incluídos na execução do contrato não constassem de cadastros de inadimplentes ou serviços de proteção ao crédito.
Ao tomar conhecimento do fato, o MPT instaurou representação contra o Banco Central. Em audiência, o advogado da Nordeste disse que o contrato com o Bacen era mantido desde maio de 2005, com 46 trabalhadores engajados na sua execução, e que a exigência passara a ser feita em 2007, por determinação de auditoria interna. Dos vigilantes, 22 tinham restrições no Serasa, e, ainda segundo o advogado, o gerente regional de segurança do Bacen teria afirmado que aqueles que não conseguissem regularizar sua situação no prazo de 60 dias seriam substituídos.
Frustrada a tentativa de solução extrajudicial do conflito, o MPT acionou o Poder Judiciário. Solicitou que a exigência fosse declarada ilegal/inconstitucional e que a autarquia se abstivesse de exigir da Nordeste as certidões negativas de restrições de crédito, de aplicar penalidades contratuais pela não apresentação delas, de promover retaliação direta ou indireta contra vigilantes terceirizados incluídos em cadastros inadimplentes e de condicionar a aceitação desses trabalhadores à apresentação das certidões. Por fim, pediu aplicação de multa de R$ 200 mil em caso de descumprimento e R$ 100 mil para cada trabalhador atingido e indenização por dano moral coletivo de R$ 1 milhão, reversível ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), pela conduta discriminatória.
Os pedidos foram deferidos pelo juízo de primeiro grau, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (PE) reformou esse entendimento. Para o TRT-PE, embora o artigo 3º, parágrafo 1º da Lei nº 8.666/1993 (Lei das Licitações) proíba a previsão no edital de cláusulas ou condições que frustrem ou restrinjam o caráter competitivo da licitação, a exigência do edital do Bacen não livrava concorrentes em benefício de outros, pois cada empresa participante possui ou possuirá em seu quadro empregados com ou sem restrições nos serviços de proteção ao crédito. A exigência também não foi considerada fator impeditivo para o exercício da profissão, ante a possibilidade de remanejar trabalhadores que não se enquadrassem nas condições exigidas, uma vez que a Nordeste, empresa vencedora do certame, contava com mais de dez mil empregados.
No julgamento do recurso do MPT pelo TST, o advogado do Bacen lembrou do assalto ocorrido na agência do banco em Fortaleza, onde se constatou a participação de vigilantes, o que justificaria, a seu ver, a adoção de tais medidas. O relator, ministro Pedro Paulo Manus, porém, votou no sentido de dar provimento ao recurso.
O principal fundamento adotado pelo relator foi o do livre exercício de qualquer profissão, disposto no artigo 5º, inciso XIII da Constituição da República, atendidas as qualificações profissionais estabelecidas em lei – e o fato de a Lei nº 7.102/1983, que disciplina a função de vigilante, não prever nenhuma restrição ao seu exercício no caso de débito registrado em serviços de proteção ao crédito. Para o ministro Manus, ao criar essa exigência para a contratação de vigilantes o Bacen estabeleceu situação não prevista em lei. "Ora, se o próprio bancário – que lida diretamente com grande quantidade de numerário – não tem restrição para o exercício da profissão, no caso de não pagamento de dívida, muito menos se pode exigir do vigilante que se adeque a requisito totalmente desvinculado da sua atividade-fim", concluiu. A decisão foi por maioria, vencido o ministro Ives Gandra Martins.
(Lourdes Côrtes/CF)
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